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Mostrando postagens de janeiro, 2016

Madame Bovary, de Gustave Flaubert (II)

Depois do clássico, vale a pena ler A orgia perpétua: Flaubert e Madame Bovary , de Mario Vargas Llosa: um estudo completo da obra, em três aspectos: - o impacto que o romance lhe causou como leitor - algo que sempre me interessa: Um punhado de personagens literários marcou minha vida de maneira mais duradoura que boa parte dos seres de carne e osso que conheci (...) Nesse círculo heterogêneo e cosmopolita, bando de fantasmas amigos que se renova segundo as épocas e o humor - hoje eu mencionaria de imediato D'Artagnan, David Copperfield, Jean Valjean, o príncipe Pierre Berzúkhov, Fabrice del Dongo, os terroristas Tchen e o Professor, Lena Grove  o condenado alto - ninguém mais persistente e com quem tenha tido uma relação mais claramente passional que Emma Bovary. - a análise detalhada da obra, desde sua concepção, sua estrutura, as influências da realidade e dos autores que Flaubert leu durante os anos de construção do seu romance, além, claro, de aspectos da vida do

Madame Bovary, de Gustave Flaubert (I)

Um exemplo dos mais didáticos sobre como literatura não se resume a enredo: um adultério envolvendo personagens provincianos. Ao menos no Brasil, gerações de estudantes de ensino médio são estimuladas a passar ao largo de um dos maiores romances já escritos; a "'maravilha do mundo' entre todos os romances", "o primeiro romance rigorosamente construído como um poema", cuja "releitura e re-releitura sempre fazem descobrir concatenações inesperadas", dizia Carpeaux. Em Flaubert, o estilo é o grande destaque; o trabalho de ourivesaria na construção das frases, da preocupação em encontrar a palavra correta. Poucas vezes isso será tão evidente como em Madame Bovary e, neste romance, em momentos como o da descrição da exposição agrícola - os anúncios dos prêmios para o progresso - e as conversas entre Emma e Rodolphe, o primeiro de seus amantes (que dela irá se livrar sem maiores arrependimentos). Um falando platitudes sobre a política, o outro,

Sleep Winter, de Nuri Bilge Ceylan (2014)

Um ator se afasta da profissão e se refugia no comando do hotel da família, numa cidade do interior turco, perdida no meio da Capadócia. Sua carreira não foi o que ele esperava. Escreve para um jornal de alcance também relativo (e, portanto, é menos lido do que gostaria). Este é Aydin (Haluk Bilginer, um dos atores mais conhecidos do país), o Tio Vânia do diretor turco Ceylan.  As tomadas longas, os longos silêncios, entrecortados pelos diálogos tensos de Aydin com sua mulher mais jovem, a infeliz Nihal (Melisa Sözen), que se lança em projetos filantrópicos e está pensando seriamente em abandonar o marido, e a irmã separada Necla ( Demet Akbağ), duas infelizes naquele fim de mundo. Aydin também está bem enrolado com seus inquilinos que lhe devem dinheiro mas não respeito, Ismail e seu filho. São mais de 3 horas de filme, propositalmente lento. Talvez demais para a maioria das pessoas hoje. Mas vale, e muito, a pena. Há momentos de puro teatro tchekoviano e outros de ci

Puhdistus (Expurgo), de Antii Jokinen (2012)

Completamente ignorado no Brasil, o filme de Antii Jokinen é a adaptação do romance de Sofi Oksanen,  Expurgo . E, no entanto, surpresa, está perdido na grade de opções da TV a cabo. Vai entender... Bastante fiel ao livro, algo não tão comum assim, Jokinen traz a história de Zara, que na busca por um emprego acaba se tornando uma escrava branca de um grupo de mafiosos. Agredida e violentada - o filme, aliás, é extremamente violento - consegue fugir e aparece no quintal da casa da velha Aliide (Laura Birn está ótima como a Aliide dos anos 40; Liisi Tandefelt é a velha). Há uma desconfiança inicial mútua, mas ambas sofreram abusos semelhantes - há uma ligação pessoal entre as duas que se revela ao longo do livro/filme. Uma traição que mudou o destino de ambas (o que ocorreu nos anos 40 atingiu a jovem Zara do século XXI).  Jokinen fez uma adaptação realista ao extremo do romance que rendeu a Oksanen o Femina de 2010. Um pedaço importante da história da Estonia, entre a o

Rembrandt, de Alexander Korda (1936)

Falando em Rembrandt, este filme de Alexander Korda - nascido na Hungria com o nome Sándor Lászlo Kellner - de 1936 é considerado um dos melhores já feitos sobre a vida do holandês. Mesmo hoje, passados 80 anos, permanece  Padura: Porque Rembrandt chorou na tarde de 1656 quando, vencido pelas pressões dos credores, teve de declarar falência e abandonar a sua querida casa no número 4 da Jodenbreestraat, enquanto membros do Tribunal de Insolvências Patrimoniais faziam o inventário de todos os seus pertences, obras, lembranças, objetos, acumulados durante anos, para serem liquidados em leilão público. Charles Laughton teve aqui uma de suas mais destacadas interpretações. Rembrandt está com seu filho Titus, sua última mulher, Hendrickje Stoffels (interpretada por Elsa Lanchester, mulher de Laughton) e seu amigo, o ex-rabino Menasseh ben Israel. Saskia morre logo no início, o que faz com que o pouco ajuizado financeiramente Rembrandt perca suas últimas posses.  A necessidad

Hereges, de Leonardo Padura

Leonardo Padura realizou outra grande e detalhada pesquisa histórica para nos lembrar da história do S.S Saint Louis. O navio zarpou de Hamburgo, em 1939, com mais de 900 judeus desesperados por um abrigo que lhes permitisse escapar do já conhecido destino reservado aos judeus pelos alemães. Cuba já possuia uma comunidade judaica importante. Na década de 20, parte significativa dos judeus de Kirklareli, no finado Império Otomano, passaram por lá - muitos ficaram, outros partiram para os Estados Unidos e até para cá..., mas isso é assunto para outro momento. O fato é que, por pressão americana (os EUA só entrariam na guerra no final de 1941), Cuba foi forçada a negar o asilo, ao cobrar dos refugiados tamanha soma de dinheiro que, na prática, fez com que o navio retornasse para Hamburgo da forma como veio. Desesperados, os passageiros saltavam ao mar. O navio também foi expulso dos EUA e do Canadá. Escrito antes do estouro da crise de refugiados de 2015, é impossível

Primo Levi

Matéria publicada na  Folha  sobre Primo Levi, o grande escritor o Holocausto. A Biblioteca Nacional promoverá, nos dias 27 a 29 de janeiro, evento para celebrar a obra do italiano - no 71º aniversário da libertação de Auschwitz. É isto um homem? foi recusado por diversas editoras - que afirmavam que o tema não despertaria o menor interesse no público.  O artigo também trata do mistério envolvendo sua morte, aparentemente suicídio. Há quem defenda a ideia de acidente. O fato é que ele foi encontrado morto após cair do terceiro andar do edifício em Turim onde viveu a maior parte da vida. Eternas discussões sobre seu estado de saúde, sua eventual depressão - que era anterior à guerra - e seus projetos para o futuro. Mas o que não se pode negar é a importância de sua obra. Ninguém chegou perto de Levi na tradução em palavras da experiência dos campos, em livros profundamente autobiográficos. Ao lado da obra-prima É isto um homem? , A Trégua também é de leitura obrigatória p

Os inacabados

Na semana em que o autor da série Game of Thrones anunciou não ter conseguido acabar o último livro da série, o jornal Observador , de Lisboa, traz matéria sobre as grandes obras inacabadas de grandes escritores.  Kafka e América, Flaubert e Bouvard e Pécuchet, Saramago, Joyce, Twain e tantos outros estão na fotogaleria. Hasek também morreu ditando seu o bom soldado Svejk. A matéria pode ser lida  aqui.