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O Pecado do Padre Ondrej, de Jaroslav Hasek (uma história para ler na faculdade de direito)

O conto da semana é novamente de Jaroslav Hasek.

O padre Ondrej completava dezoito anos no Purgatório, sem saber o porquê. Seu caso ainda não havia transitado em julgado, e ele vivia perguntando aos Anjos a razão de sua permanência. Um dia, peticionou à Honorável Corte do Último Julgamento, que respondeu que o seu caso não estava previsto para os próximos anos...

Anos se passaram. Um belo dia, recebeu uma intimação para comparecer ao Sagrado Senado. Lá chegando, ouviu uma voz: “Estamos estudando o Livro da sua vida. Tudo está bem, com exceção de uma página... Eu te pergunto: você tem um irmão na Austrália?”

“Sim”, respondeu. O Senado insistiu, com a solenidade peculiar – você escreveu para ele?, ao que respondeu afirmativamente – para Sydney, em 1882.

Então, foi dito que, de acordo com De Retractione vel Librorum Recensione, Santo Agostinho proclama que a crença nos antípodas é uma heresia; como a Austrália é parte dos antípodas, acreditar na sua existência é heresia, cometida e confirmada pelo réu. Evidentemente, foi destacado na sentença, o estado de purificação do acusado é uma atenuante. E foi sentenciado a 15.000 anos de confinamento no Purgatório, o que incluiu seus 22 anos de detenção investigativa.

Os Anjos o consolaram: isso poderia ter te acontecido em qualquer tribunal na Terra...

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